Por Luna D’Alama
O programa Boas Práticas Agronômicas (BOAS) abre espaço para divulgação de uma série de iniciativas na área de boas práticas que estão em curso no Brasil. Uma das ações que vêm se destacando é a realizada em parceria entre o engenheiro agrônomo e entomologista Odair Fernandes, professor da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Universidade Estadual Paulista (Unesp), e a cooperativa Coplana, na região metropolitana de Ribeirão Preto e nas proximidades de Araraquara.
O projeto de Manejo Integrado de Pragas (MIP) e Manejo de Resistência de Insetos (MRI) teve início em 2014/2015 e já está indo para a quarta safra, com foco em plantações de soja. “Uma vez por semana, três técnicos agrícolas se dividem e visitam 110 propriedades de 24 municípios, como Jaboticabal, Ribeirão Preto, Guariba e Ibitinga. Ao todo, são monitorados 8.500 hectares de 35 produtores”, conta Fernandes.
Os agricultores que plantam culturas Bt são orientados a adotar uma área de refúgio em 20% da lavoura. Na safra 2016/2017, 88% dos cooperados da Coplana cumpriram esse requisito, aponta o professor da Unesp no campus de Jaboticabal. “Queremos bater a meta de 100% em 2017/2018. Isso só será possível porque há um envolvimento profissional e muito sério da cooperativa em abraçar a importância do MRI e do refúgio”, afirma. Um dos benefícios oferecidos pela cooperativa nesse sentido é que, ao comprar as sementes Bt e as não Bt (para o refúgio), o produtor recebe suporte técnico para monitoramento de pragas.
“Em um primeiro momento, verificávamos apenas a presença de insetos adultos (como a lagarta falsa-medideira, a Helicoverpa armigera e o complexo Spodoptera spp.), usando armadilhas com feromônios. Explicamos que a tecnologia Bt é específica para algumas pragas-alvo e que a aplicação de inseticidas no refúgio precisa ficar em um intervalo que ainda garanta a produção de insetos, mas sem comprometer tanto a produtividade”, afirma o engenheiro agrônomo. De acordo com ele, os produtores da região realizam, em média, de quatro a seis aplicações de inseticidas no refúgio a cada safra.
Segundo Fernandes, a soja é capaz de tolerar até 30% de desfolha no período vegetativo e 15% no reprodutivo, sem que seja necessário aplicar inseticida. “Mas os produtores aguentavam, normalmente, só 5%. Agora, com o nosso acompanhamento, eles estão começando a entender melhor isso e não ficar tão apavorados”, revela. No caso de pragas como Anticarsia gemmatalis, Chrysodeixis includens e Rachiplusia nu, uma quantidade considerada preocupante é a partir de 20 lagartas por metro, tanto no período vegetativo quanto no reprodutivo. Já para a Helicoverpa spp. e a Heliothis virescens, o agricultor deve ficar atento a partir de quatro lagartas por metro no período vegetativo ou duas por metro no reprodutivo.
“Batida de pano” e aplicativo de celular
Desde a safra 2015/2016, o projeto também introduziu uma técnica chamada “batida de pano”, que coloca um tecido de um metro de comprimento entre as linhas de soja. As plantas, então, são chacoalhadas, as pragas caem e são contabilizadas. “Estabelecemos um ponto de monitoramento por hectare na área de refúgio e por volta de cinco na soja Bt. Se identificarmos infestação, o produtor é comunicado e toma a decisão de fazer ou não o controle, com base em um critério técnico”, diz o professor da Unesp.
Além de monitorar os insetos adultos e fazer amostragens, o trabalho inclui o treinamento dos técnicos pela Unesp e reuniões com os produtores antes e depois de cada safra. A partir de 2016/2017, foi firmada, ainda, uma parceria com uma empresa de tecnologia de Ribeirão Preto para desenvolver um aplicativo de smartphone que torna mais fácil a comunicação entre técnicos, produtores e os pesquisadores da Unesp. “Até 2015/2016, falávamos apenas via grupo no WhatsApp, trocando informações diárias sobre pragas, chuvas e plantio. Agora, o app AgroGestor tornou a coleta e a divulgação de dados mais simples”, compara Fernandes. Cerca de 120 produtores utilizam esse recurso atualmente.
“As informações sobre o que aconteceu naquele dia e nas duas ou três semanas anteriores – que apontam tendências – vão diretamente para o celular do técnico e, depois, são centralizadas na cooperativa, compiladas e enviadas ao agricultor. Além disso, a cor verde sinaliza uma população de pragas em nível tolerável, amarela quer dizer “atenção” e vermelha, perigo. Isso alerta os produtores e os ajuda na tomada de decisão”, afirma Fernandes. Ele diz que não imaginava, inicialmente, que os cooperados da Coplana teriam tanto interesse em saber o que acontecia nas propriedades de seus vizinhos. “Mas percebemos que eles querem saber, sim, e uma comunicação rápida foi vital nesse processo. As pessoas se contagiam com as boas práticas, um conversa com outro e assim vai”, destaca.
Na safra 2017/2018, o aplicativo passará por ajustes para ser aprimorado, e os agricultores devem participar desse processo. “Queremos que eles também alimentem o software com informações, assinalem se já usaram inseticidas e quais foram esses produtos. Assim, poderemos acompanhar o número de aplicações, dimensionar a eficácia dos produtos e saber quem não utilizou ainda. Tendo um maior controle, conseguiremos fazer um trabalho de conscientização com quem aplicou inseticidas de menos ou demais (sem necessidade) e com quem aplicou muito tarde, quando o dano já estava instalado”, completa o professor da Unesp.
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